Tuesday, September 13, 2005

«… Aguardo a madrugada, impaciente
Os pés descalços na areia…»

Eugénio de Andrade

Despedida. Mais um dia de tantas palavras por dizer, pensadas durante as coisas inadiáveis que as adiam. Tomo o tempo até à exaustão, onde os minutos previsíveis sufocam o imprevisível e adormeço num sono em que os sonhos me chamam e eu vou. Vagueio por cidades onde as casas têm um tecto de céu e as estrelas cantam as canções da nossa história. Lentamente, foge-me a alma para o longe da tua ausência, onde a noite tem a tua pele e a lua o teu encanto, onde a mais longa distância diminui o caminho entre as nossas almas. Mais um dia infinito de quieto olhar. E outro, no suave embalo do nascente, onde procuro no conforto de um azul celeste a magia do teu regresso. E sempre encontro a coragem para partir e voltar sempre a este lugar onde te espero para sempre. A manhã do teu regresso perfumou-se de um céu luminoso que mereceu o aplauso aliviado do meu coração. Os meus pés dançaram guiados pela orquestra da minha respiração ansiosa. Reconstruí o meu sorriso e conduzi o meu espaço na tua direcção. Na hora em que sustentei o teu olhar num aveludado silêncio escudado na noite percebi que dizer-te é dizer uma vida inteira. Nos teus olhos de cor de ver tudo o que existe dentro dos meus há qualquer coisa que se reacende. Uma luz que é fogo e arde por dentro. Abraço-te como quem abraça a vida e sei que sempre que a minha força não quiser acordar, por mais distantes que os teus braços estejam, virás tu sacudir-me a lágrima e segredar-me as coisas que mantêm acesa a razão da minha saudade. E permito-me desaguar em ti porque o teu regresso serve o esquecimento da dor que é não te ter. E tudo à volta se esbate e se dissimula enquanto os nossos corpos flutuam no encanto inquebrável do nosso presente. E as mãos. O contorno das bocas nas pontas dos dedos. A maravilhosa fusão da nossa pele. Com os fios de seda e do linho com que se tecem os momentos marcantes amo-te e viajo no silêncio das palavras que não precisam de ser ditas. Na perfeição dos sentidos, anestesiada pela tua ternura, adormeço na certeza de que é contigo que quero estar porque só tu me concedes o sabor da eternidade.

2 comments:

Anonymous said...

O sabor mais doce do mundo é o sabor da eternidade. Este brocardo, que podia ser mais um lugar comum, trata-se, na verdade, de uma contestação "lapaliciana". Porque tanto o mal como o bem, o amor e o ódio, a verdade e a mentira, todos têm um sabor para o qual não temos tempo de apreciar, interiorizar, valorizar. Claro que o tempo que leva a degustar o amor é infinitas vezes superior ao tempo que leva a perceber o ódio, e que sempre achei q uma vida inteira para dedicar ao nobre sentimento celeberizado por Romeu e Julieta, seria pouco tempo. Daí ser necessário encontrar a pessoa certa, como me aconteceu, para, com olhos "de cor de ver tudo o que existe dentro" da outra pessoa vibrar em cada segundo! e VIBRO...em cada segundo percebo o que escreves e subscrevo por inteiro.

Joana said...

Agradeço o tudo que constantemente me ofereces...