Friday, October 05, 2007

As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir…


Estive para te escrever mas não consegui encher as palavras com a vida de tantos anos passados… As folhas rasgadas a meio de memórias revisitadas ainda se encontram espalhadas pela casa e em cada recanto encontro uma palavra perdida que és tu. Simplicidade. Essência. Encontro-te na verdade, na dor e ainda mais na saudade. Só consigo apreender-te nesta história desconexa, feita de textos escondidos e de lugares perdidos, consumidos pelo constante regresso à casa de partida das nossas vidas.
Hoje voltei a tentar escrever-te mas parei no primeiro ponto final que fui capaz de desenhar. E não sei continuar-te…

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade.

Friday, August 10, 2007

Solidão I

Passa uma morena sorridente, jovem de idade, traços delgados mas definidos, rosto diáfano, esguio mas condensado, de olhos esbugalhados para o oxigénio do dia, azuis quais pedras gélidas, mas doces. Calmos. Olha para mim como se me visse e num sorriso de dó pergunta-me se não quero ajuda para atravessar a estrada. Ajuda para quê, mal fique verde podemos atravessar e apesar de levar mais tempo a comandar estes trapos de pernas, ninguém se importa mesmo, pensei. Antes que pudesse tartamudear a minha cólera, a mão de pele sadia e fresca atestou as minhas rugas e feridas e ajudou a transportar-me para o outro lado. Enquanto caminhava, de cabeça baixa, tentando delinear os traços aprazíveis daquela rapariga em breves esgares, descobri que já não sabia a cor do carinho e não conseguia recebê-lo em mim. A aragem fazia dançar os seus cabelos compridos, com a transparência dos vinte, e embelezava ainda mais as linhas definidas do seu rosto cheio de um tudo que não me lembro de alguma vez ter possuído.
Está bem aqui, não precisa de nada, pergunta-me com uma doçura intérprete de alma sonhadora. Se preciso de alguma coisa, não sei, nunca ninguém me perguntou. Acho que não. E não agradeço, não sei fazê-lo e engulo a minha angústia por ser forçada a reconhecer a sobrevivência de corações no meio desta selva humana e isso ainda me transtorna mais.
Afinal há pessoas que não precisam de se enfiar no esgoto da inexistência nem render-se ao despotismo social para conseguirem afirmar a bondade gratuita do coração.

Wednesday, August 01, 2007

É bom reviver-te em mim mesmo na solidão da noite mais profunda, em que colecciono textos de palavras pequenas que testemunham aquilo que é mais instantâneo na saudade: a lágrima sem território, que desenha no rosto traços visíveis da tua ausência permanente.
Sabias disso? Que este segredo de te manter vivo é a única força que me impõe o acordar em tantos dias seguidos, que o procurar-te nas cores dos olhares das outras pessoas é o único caminho que os meus pés conseguem desbravar?
Não consigo aprender a fórmula mágica de te esquecer. Aquela música ainda abala o meu ritmo cardíaco, a imagem da tua possível chegada ainda alarma o meu silêncio e aquela verdade que só as palavras da tua boca conseguem proferir ainda me apoquenta o espírito.

E a tua ausência ainda me dói…

Friday, July 27, 2007

Pedaços de ti

Ela diz que ainda ontem sonhou com essa leveza, a que sustenta o teu sorriso cativante, mas não te encontrou. Desvanecem-lhe os traços do teu corpo por entre sonhos confusos feitos de presenças e ausências descontroladas em tempos e espaços indecifráveis.
Ela continua a dizer que é inútil a esperança e que o sonho mais não é do que soma forçada de pedaços de outras vidas que as mãos nunca tiveram coragem de agarrar e de momentos irreais cuja construção só serve para abalar a comodidade da solidão.
Mesmo descrente, parece que te continua a sonhar à noite e que é feliz nessa realidade de personagens e de histórias construídas fora do mundo das pessoas de verdade. Nesse imaginário protegido apareces vagamente descrito como luz intensa numa verdade quase infantil, as tuas mãos são fielmente reproduzidas em imagens de infindável doçura e o esboço do teu olhar é traduzido por palavras apaixonantes onduladas pela química dos sentidos.
Ontem, ela confidenciou-me que te quer rasgar da memória e que não volta a visitar-te. Mas à noite, tu és mais forte do que a resolução imediata de te esquecer e sei que ela voltará a encontrar no sonho que protagonizas a felicidade que existe na magia do desconhecido.

Wednesday, July 25, 2007

Efémero eterno

Quero tanto que a recordação de ti se eternize nas imagens que em mim guardo que quase tenho medo de continuar a viver.
Há momentos de uma perfeição poética, quase tão exagerada como a estrutura da ilusão, que nos sufocam o respirar e nos transportam para um estádio julgado inatingível de felicidade. Acrescentar-lhes novos dias, sons posteriores, ou influências externas, implica estrangular, com a repetição aperfeiçoada do recordar, o que o passado nos permitiu viver e desfocar a imagem do que já foi real.
Quero tanto recordar-te indefinidamente que quase sinto a coragem para congelar o meu coração e a parte do cérebro que imprime as fotografias do teu rosto e penso se não seria solução viável parar o decurso do meu próprio tempo, doá-lo ao nós que nunca vai existir e permitir que tu sejas a eternidade possível.
Hoje invade-me este medo de pisar o terreno estranho dos dias que ainda hão-de vir mas, enquanto a cobardia desse sentimento me impedir o abandono deste palco, vou continuar a legendar o passado com as imagens que de ti os meus olhos souberam construir, procurando agarrar este prazer que é o de conseguir eternizar a efemeridade.

Friday, July 13, 2007

Quero lá estar...

Eu quero estar quando a força te abandonar. Quero arrancar o pesadelo do teu olhar ausente, num abraço apertado e ficar contigo para o sempre que está por perto quando o início do caminho se anuncia.
Por isso fica.
Bem sei que o tempo se desvanece enquanto as palavras encontram os limites da sua finitude e que o sorriso também pode morrer.
Mas fica só hoje.
Preciso de estar quando o fim nos desligar do passado, que se eternizará em memórias do presente e do futuro, porque me assusta essa quantidade absurda de fragilidades que acumulas no peito e que te dificultam o respirar. É só por isso que preciso que queiras que eu fique.
Fica só hoje. É que hoje é o último dia...

Tuesday, May 08, 2007

A desilusão é invisível aos olhos de quem a não vive, mas é de tal maneira forte por dentro que se vai instalando em todo o ambiente decorativo, em silêncios insignificantes, é de tal maneira intensa que quando se dá por ela não há nada que se possa fazer para a não viver. A desilusão, palavra que é decerto pequena para significar a tamanha dor que inflige no que é real, apaga o sentido das coisas, desmancha o coração em pedaços e custa a abandonar a alma onde assentou a poeira do desgosto. É pesarosa, insistente, tortuosa nos caminhos por onde se evidencia. Insistente. Tortuosa. Torturante. A desilusão. Ela corrói os tendões que ligam o coração à vida, elimina qualquer sorriso que perdure e transforma o passado em único reduto de existência possível. O estado vegetativo de um corpo desiludido é uma quase morte extensível ao futuro que não será.

Friday, May 04, 2007

Ainda ando à tua procura...

Atende. Por favor, atende. Não denuncies a distância com a mensagem automatizada escrita pela tua voz formal. Não te escondas por detrás desse vidro transparente que finge abafar o teu choro calado. Atende e deixa-me encontrar-te. Atende. Ando nervosa, apagada da realidade absurda de tão frenética, palpita-me o coração que está longe, contigo, nesse lugar ermo de cor, no cimo dessa ponte frágil sem outra margem, tremem-me por dentro os vasos sanguíneos que arrefecem o meu corpo. Deixo mensagem na tua caixa de correio e volto a marcar o teu número....

Nunca chegaste a responder.

O meu coração parou no momento em que deixaste de respirar.

Estou gelada. O sangue não me corre nas veias. E a minha alma ainda anda à tua procura.

Saturday, March 17, 2007

Pareces triste

Assim, recolhida em torno de ti, abraçada ao vazio que se acumula no espaço livre das ausências em ti encostadas. Assim, com lágrimas de despedidas recentes no canto do teu coração, agora desprotegido, do lado de fora do peito. Pareces triste e eu não sei como alcançar a sombra dos teus fantasmas e amarrá-los ao tempo passado a que pertencem. Mas não estou. Dizes-me sem nunca levantar o olhar do chão, anunciando, nas palavras que ficaram retidas na afonia dos sentidos, que quase desistes. Sento-me, calada, a teu lado mesmo que o não queiras, porque a minha vida também és tu. E a teu lado, a minha mão aberta a agarrar o teu coração…

Wednesday, March 07, 2007

Fui

Voltei a olhar-te. Limpei o pó da tua fotografia presa no meu corpo e rasguei o meu coração com a tua memória. Por segundos inconsciente, decidi voltar a esperar-te como se o tempo pudesse congelar a mudança. Redescobri-te em diálogo ameno com outros, vi-te ao longe e quis acreditar que eras menos distância. Ainda pensei que o tempo nos pudesse congelar naquele ponto em que eras mais eu do que tu. Mas não. Eras sombra e luz só por aqueles instantes face ao rodopio de lembranças despertas pelas partículas de pó sacudidas do passado. Foste. E não há amanhã contigo.

Monday, February 19, 2007

Tu

Ensinas-me a ser. A respirar. A levantar voo mesmo com asas feridas e pesos de dores antigas nas minhas costas. E eu levanto-me e nem te agradeço o oxigénio que me permites respirar em mundo de negro monóxido que me fere os pulmões. Não é por mera indiferença, nem sequer por ingratidão egoísta, porque jamais soube vestir-me de estados tão frios de alma. Simplesmente, não consigo olhar-te. Nem mesmo quando me deito a teu lado na penumbra da nossa história, escrita a dois soluços desencontrados do tempo. Sinto-te apenas e não ouso querer mais do que isso. Aprendo-te assim, neste silêncio que une as arestas do nosso mundo quadrilátero, sem questionar a tua ausência quando não estás e sem te abraçar na presença difícil dos momentos. Sei-te apenas. Basta isso para conseguir ser melhor, para fortalecer esta minha fraqueza que se desfaz em lágrimas e ergue medos em meu redor. E ao saber-te não preciso de mais nada, nem de outros sorrisos, nem de outros abraços, nem de conquistas fáceis que invertem o sentido da essencialidade da verdade.

Thursday, January 11, 2007

Solidão na liberdade

Fui adormecendo embalada pelo ritmo cardíaco do teu coração e das tuas palavras incessantes. Mesmo envolta numa sonolência a que não conseguia resistir, as tuas últimas palavras ainda faziam eco no seio do meu entendimento interior sobre o seu significado. Senti uma vontade de chorar iminente porque o afastamento do amor por ti defendido funcionou como lâmina aterrada no meu coração e fez-me sentir uma dor imensa a invadir-me todos os recantos sensíveis do meu ser. Por um lado, acho que chegava a admirar a tua força, o teu desprendimento, a tua coragem de ser livre, mas, noutras alturas, sabia-te longe de mim, porque, conhecendo-me, experimentava uma forte incapacidade de te seguir nesse caminho de liberdade. Não senti, porém, rancor. No momento imediato antes de adormecer descobri apenas que não era amor o que nos unia. Era uma necessidade biológica, física, que ousava ser extenuante apenas para não deixar espaço livre para questionarmos o nada que nos envolvia como manta fina de ilusão perdida. E a solidão de que falavas seria, a partir daquele momento, a tábua de salvação do meu mundo interior, que se agitava em convulsões de dúvidas permanentes sobre se era ou não derrota aquilo que experimentava. A solidão, condição necessária para se ser livre, como me disseste, passaria a ser a minha única companhia na incessante procura da minha verdade pessoal